Adoração, Pornografia e Escravidão

escravidao-e-pornografiaEfésios 6:12  - Este texto pode ser compreendido em si mesmo. No entanto, há um outro, que pode trazer alguns pressupostos meus, referentes à cosmovisão reinante na carta de Paulo aos Efésios. Em especial, sobre o tema do “mistério oculto aos antigos”. O texto se intitula “Principados e Potestades e Pornografia”. Nele, faço uma remissão a este, de forma que os dois sejam complementares. Caso julgue necessário, recorra a ele.  

Efésios versa sobre família, que se diferencia de igreja apenas em complexidade. Paulo entende que sua vocação é a de manifestar a multiforme sabedoria de Deus. Revela-nos o Apóstolo que Deus a concebeu, viabilizou e resgatou, antes da fundação do mundo, para louvor de sua glória (Ef 1:1-14). Conta-nos também que seus planos estiveram, por um pouco, conturbados por Satanás (2:1-3). Ele explicita, então, em que condições Deus nos encontrou, o que fez por nós — e com que motivação (2:4-10). Mostra-nos que, em Cristo, somos resgatados à condição de família, novamente (2:13-22). E nos surpreende ao dizer que, com tudo isso, estava ensinando a principados e potestades sobre um segredo seu; um mistério que esteve oculto em Deus (3:10), segredo esse que nem aos pais e profetas foi dado conhecer, mas somente a nós (3:4-7). E agora que conhecemos o mistério, Paulo nos convoca a vivermos coerentemente com um chamado de Deus — chamado a participar, com nossas vidas, do julgamento de principados e potestades, ao realizar e consumar, por meio de Cristo, o projeto “família” (4:1-6).

Para tornar possível esse projeto, ele distribui dons aos homens, enviando seu Espírito (4:11-16). No capítulo 5 todo, o Apóstolo nos ensina sobre como viver essa nova dimensão de vida: com as pessoas, com irmãos, marido e mulher, pais e filhos, patrões e empregados. O desafio é, sempre, relacional (5:21).

Finalmente, no capítulo 6, alerta-nos para o fato de que Satanás não vai se conformar com essa derrota. Vai reagir, buscando modos e meios de minar o edifício erguido por Deus (6:11). É quando chegamos ao nosso texto-base: “Porque a nossa luta não é contra o sangue e a carne, e, sim, contra os principados e potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas regiões celestes”.

Adoração e Idolatria

Essa luta contra principados e potestades nos joga numa arena que vai muito além de pecar ou deixar de pecar; fazer coisas boas ou feias; a luta contra principados e potestades está no âmbito da adoração ou da idolatria, seu correspondente corrompido.

O que espera Deus de suas criaturas? — Adoração! Ele passeia, gostoso, no meio dos louvores; ele habita no meio dos louvores. “Contudo és santo; entronizado entre os louvores de Israel”, diz Davi no Sl 22:3. Por outro lado, o que espera Satanás de seus, adeptos? — Adoração! Entronização! Ele quer aquilo que somente ao Criador é devido: o coração. “E elevando-o mostrou-lhe num momento todos os reinos do mundo. E disse-lhe…: Dar-te-ei toda esta autoridade e a glória destes reinos, porque ela me foi entregue, e a dou a quem eu quiser. Portanto, se prostrado me adorares, toda será tua. Mas Jesus lhe respondeu: Está escrito: Ao Senhor teu Deus adorarás, e só a ele darás culto (Lc 4:5-8)

Deus e Satanás sabem que ninguém pode servir a dois senhores; amaremos a um e aborrecer-nos-emos do outro (Mt 6:24). Ambos sabem que somos como quem procura boas pérolas; e que, ao acharmos uma pérola de grande valor, venderemos tudo quanto temos para comprar aquela pérola (Mt 13: 45-46). Entre outros motivos, porque sabem que aquele que conquistar nosso tesouro — aquele que personificar, encarnar, for percebido por nós como a fonte ou origem do nosso tesouro —, conquistará nosso coração. “Porque onde está o teu tesouro aí também estará o teu coração” (Mt 6:21). É por isso que entendo que as tentações (peneiras espirituais) de Abraão, Moisés, Pedro e Jesus, entre tantos outros, foram guerras espirituais, nas regiões celestes, pela posse da fonte da vida, pelo senhorio do coração desses homens (Lc 22:31). Vale a pena atentar na redação dos textos, por si só elucidativa. A Abraão, Deus diz: “Não estendas a mão sobre o rapaz, e nada lhe faças; pois agora sei que temes a Deus, porquanto não me negastes o filho, o teu único filho” (Gn 22:12). Já Moisés, após ter sido proibido de entrar na terra prometida, em vez de murmurar, ensina o povo, com o coração manso que tinha: “Ele é o teu louvor, e o teu Deus, que te fez estas grandes e temíveis cousas que os teus olhos têm visto” (Dt 10:21). Por seu turno, Pedro reage à sua peneira com o seguinte coração: “Senhor, tu sabes todas as cousas, tu sabes que eu te amo” (Jo 21:17). E Jesus, em pleno abandono da cruz, reage ao ressentimento, com a famosa declaração do salmista: “A meus irmãos declararei o teu nome; cantar-te-ei louvores no meio da congregação” (Sl 22:22).

A questão que se coloca, então, é: a quem servirão esses corações? A que espírito inspirador e mentor? A quem cantarão louvores? Quem há de enchê-los de alegria significado, sonhos e esperança, como uma noiva com seu noivo? Quem há de ser seu refúgio na hora da dor? Em que altar oferecerão seus filhos recém-nascidos? Em que caminhos os educarão (ou deixarão que “escolham seu próprio caminho”)? Que linguagem lhes legarão por herança (a da fatalidade, da amargura, da vida dura, do azar na loteca, do “nenhum governo presta”, “nenhum patrão é justo”, da amargura ou fatalismo da vida?) Que exemplo lhes darão? Porque os “tesouros” geram uma linguagem que redefine a realidade, o mundo onde você habitará; esses tesouros moldarão seu coração, e farão quem você é; e essa linguagem estará na sua boca, na sua música; também na sua queixa, na sua murmuração, “porque a boca fala do que está cheio o coração” (Lc 6:45).

Certamente, por compreender realidade tão grave é que o sábio nos exorta veementemente: “Sobre tudo o que se deve guardar” — diz ele —, “guarda o teu coração, porque dele procedem as fontes da vida” (Pv 4:23). Eis outra maneira de apresentarmos nosso tema: o cuidado que devemos ter com o coração.

Os protagonistas desse jogo descomunal não estavam lutando apenas para se definir por crer ou descrer; obedecer ou rebelar-se; adorar ou blasfemar — para ganhar um prêmio ou um castigo no final da vida; para passar de ano no final do curso — estavam lutando pelo destino de suas almas e de sua descendência — Abraão; de seu povo — Moisés; de suas ovelhas — Pedro; da humanidade toda— Jesus. Lutaram encarniçadamente “contra principados e potestades; contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal nas regiões celestes”.

Conclusão

Preciso falar sobre a relação entre pornografia e escravidão? Preciso perguntar por que um casal precisa de um filme erótico para alimentar suas fantasias sexuais? Preciso perguntar de quê um coração se alimenta, ao passar horas e horas em sites pornográficos, olhando, consumindo, satisfazendo-se, saciando-se? Preciso perguntar que linguagem de descrição e definição do mundo corre solta nos tele-sexo, nos chats da madrugada, ao ponto de fazer alguém pensar que a tara é normal e que o maníaco do parque é apenas um doente mental? E que isso não tem nada a ver com “principados e potestades”?

Preciso perguntar que poderes e senhores estão por trás desses “alimentos da alma”? Preciso perguntar o que estão tentando fazer com as fontes da vida, com o nosso coração?

Ainda há alguma dúvida sobre seu poder solerte e capcioso de se fazer adorar? Espero que você esteja entendendo meu argumento disfarçado de perguntas. Se não, tente largar essa Playboy sem oração, sem converter seu coração a um outro senhor! porque se é isso que alimenta sua alma, você vai passar muita fome! Você vai sofrer dores horríveis, provenientes da síndrome de abstinência! Tente largar o site pornográfico sem jejum, sem arrancar o olho que lhe faz pecar; tente controlar sua linguagem capciosa e cheia de duplos sentidos, sem mudar o coração; tente cantarolar um corinho enquanto assiste a um clip erótico! — não podemos servir a dois senhores!

Vou mais longe: tente falar de liberdade, de alegria, de paz, de família, de filhos, enquanto segura (ou é segurado por) esse inocente copo de cerveja! Você não está lutando contra a substância álcool; isso é criancice! Você está lutando contra principados e potestades que se infiltram no centro de decisão, no comando superior de sua vida, seu coração, e sabotam sua vontade, para que ela conspire contra tudo o que você mais ama. Jovem, o álcool, quando idolatricamente obedecido, é antimatéria familiar! Seu mentor destrói, hoje, a família que você pretende ter no futuro.

Concluindo, e de volta a Efésios: preciso perguntar que estratagemas o diabo está armando para minar sua família — existente ou futura — e a igreja, com os solitários e soturnos “lanchinhos” da madrugada na TV, na Internet, no cinema?

Bem, leitor, eu preciso me perguntar, a esta altura, o que alimenta o meu coração. Será “leite e mel” ou ração para cachorro; “bozo” espiritual, que eu vou comer na mão do meu adestrador, nas regiões celestiais? E, impotente, ouvi-lo ordenar: Seat!

É tempo de decisão, como propõe o autor de Hebreus. Ouça, Hoje, o que Deus nos propõe, por intermédio de Isaías:

Por que gastais o dinheiro naquilo que não é pão: e o vosso suor naquilo que não satisfaz? Ouvi-me atentamente, comei o que é bom, e vos deleitareis com finos manjares. Inclinai os vossos ouvidos, e vinde a mim; ouvi, e a vossa alma viverá; porque convosco farei uma aliança perpétua, que consiste nas fiéis misericórdias prometidas a Davi. (Is 55:2,3)

Você pode estar se dizendo: por que dirigir uma mensagem dessas a crentes? muitos dos quais pastores ou líderes em suas igrejas? E eu me lembro de uma propaganda que lia no bonde, quando criança. Um texto complicado, que eu só vim a entender depois de grande. Dizia assim: “Veja, ilustre passageiro, que belo tipo faceiro se senta ao seu lado. No entanto, acredite, quase morreu de bronquite, salvou-o o rum creosotado”. Você olha para o lado e não imagina o que está passando seu irmão. Ele também não faz idéia de suas dores e fraquezas.

Nunca sabemos bem a quem nos dirigimos, quando apresentamos uma mensagem tão pouco usual. Mas Deus sabe. Tenha ele misericórdia de nós, indistintamente. Em especial, do mais necessitado de todos: eu.

 

rubem-amorese